domingo, 28 de agosto de 2016

Cena cearense

Teatro de desopressão
por maneco nascimento

“Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negro”, da Associação Artística Nóis de Teatro, de Fortaleza, Ceará, marcou pauta indispensável na agenda do FestLuso 2016 – Ano Júlio, com seu teatro político, expressivo, de identidade e pertencimento social de defesa cidadã e cultural de sobrevivência.

No transversal da cidade, comportamentos, fé no humano e religiosidade, como representação de empoderamento na cena, à fórmula de discutir o gargalo da sociedade e seus entraves de vidas corriqueiras, no eixo das cidades visíveis, em detrimento das  invisibilizadas, é o espetáculo licenciado, em exposição dramático expressiva pela dialética da cena do oprimido. O novo navio negreiro e os modelos atualizados de opressão e desova dos herdeiros da Nau castroalvina .

A feliz apresentação de “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro”, aconteceu na porta do Theatro 4 de Setembro, no  passeio que margeia a calçada da Casa de espetáculos . Às 18h30, um elenco antenado e vigoroso repercutiu a história de Nathanel, seu percurso anti heróico de quem nasceu com tradição do “erro”, numa sociedade brasis de negros, pardos, e negros, em que as desequidades impostas determinam quem sempre estará sujeito à vertiginosa queda livre da Roda da fortuna, que lhe coube como sorte.

Espetáculo pancada, interfluxa sincretismo religioso, música de expressão das periferias brasileiras, discurso panfletário de revisionismo e reparação das diferenças sociais e posição social de ilustração das funções de opressor e oprimido, na construção social determinista brasileira. 

Atualiza política, justiça, polícia, tudo no mesmo cinturão nevrálgico de discussão, crítica e exploração da natureza espírito de porco institucional, a que está submetida uma grande parcela populacional, em sua maioria expressiva negra, no país.

Um drama apropriado da linguagem dramática de repercussão da falha trágica do anti herói e catarse aplicada ao distanciamento crítico, “Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” consecciona um elenco registrado e tarimbado na práxis do teatro de rua, gerado na identidade de referências augustoboalinas, que influxiona a personagem-público para dentro da narrativa e a torna parte proativa do discurso apresentado, numa representação cênica realístico de impulsionar o cidadão crítico da própria realidade.

Os interpretes Jefferson Saldanha, Doroteia Ferreira, Kelly Enne Saldanha, Altemar Di Monteiro, Henrique Gonzaga, Amanda Freire e Maurício Rodrigues revezam arte, dinâmicas, talento e energia alegre e contundente, ao variarem em personagens que vão e vêm na tessitura do espetáculo que mastiga, engole e joga fora a platéia, para que ela vire regurgito da própria condição de sobrevivência, a partir da particular observação do outro, em si mesma.

Um conjunto de criadores que reúne Altemar Di Monteiro (coordenação geral); Murillo Ramos (direção) e, de novo, Altemar Di Monteiro, na dramaturgia e assistência de direção, em íntima parceria com a cenografia, de Jefferson Saldanha; figurino expressivo, de Miguel Campelo; formas à animação-bonecos, de Carlos César, adereços, de Pádua Oliveira, e maquiagem, Kelly Enne Sldadanha, garantem um dinamismo quente e uma carpintaria de vívida presença criativa e cena viva contemporânea e política.

O Coletivo Nóis de Teatro e o espetáculoTodo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreiro” cumprem papel social, de arte e cultura, e papel político de interagir estéticas que reverberem vida em comunhão com o fazer artístico e olhar reflexivo.

Todo Camburão Tem Um Pouco de Navio Negreirocumpre, eficazmente, 
os papéis sociais a que está imbuído na construção cultural da práxis cênica que realiza.



fotos/imagem: (Assoc. Artística Nóis de Teatro)

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