quinta-feira, 28 de abril de 2016

Amores de margem

dança de passagem
por maneco nascimento

[(...) Gurdjieff propõe estudar as vibrações que os ritmos e melodias causam dentro do corpo. As transições entre as posturas colocam o nosso corpo como um passageiro ativo/passivo dentro do fluxo exigente de aprendizado de coordenações motoras e espaciais de grandes dinâmicas. Para isso é necessário um longo trabalho para deixar-se preencher por aquilo que é simples, mas que contém uma enorme complexidade. Os efeitos das danças são mais evidentes e inesperados, dependendo de como nos exercitamos e da qualidade da nossa atitude interior. Os movimentos nos enraízam de forma profunda em nós mesmos. Eles descascam todas as ilusões culturais e sociais. O corpo precisa relaxar para conhecer quem o habita e reconectar a essência (...)] ( do Carmo, Lina. Corpo do Mundo. Rio de Janeiro: Livros Ilimitados. 432 p. [Bem-vindo à fricção, pags. 390])

Na última terça feira, 26 de abril, o Complexo Cultural Club dos Diários/Thetro 4 de Setembro retomou o Projeto Terças da Casa e, na versão Terça Dança, apresentou  estreia de novo espetáculo de nova dança à cidade.


Com direção e coreografias de Beth Bátalli, o espetáculo "Amores" traz, à observação pública, uma nova proposta da bailarina e coreógrafa, em que ilustra na discussão de corpos no expresso da dança aos sentimentos e ações que corroboram e ou se enfrentam no tema de paixões, amores e dores, inflexionados pelos movimentos e desenhos propostos pela dramaturgia.

A estreia de "Amores" deu-se no Theatro 4 de Setembro, às 19 horas. Estava assinalado em arte de dança, o Terças da Casa - Terça Dança e o movimento de corpos, em vozes e linguísticas aplicadas, à práxis das falas do corpo experimentadas por Beth Báttali e o corpus que compõe o objeto de propósitos em dança nova.

Na cena, os aprendizes de feiticeira, Atena Adriana, Antoniel Novaiz,  Mary Sousa, Ramon Ferreira, Sidarta Kamala e Robert Rodrigues, regidos por Báttali, em esforço dedicado para exprimir bem o tema dado e, imprimir identidade ao sujeito que faz-se em dança de si para o outro e encontre reverbero do outro para cada um(a) na cena, que desenvolvem ao enredo dramático.

Canções populares nacionais encontram sinais de entrada para mapeamento e descrição dos sentimentos que passam pelo corpo e eneagramas de "eu periféricos" (Gurdjieff) que conseguem trazer à tona da expressão a gestos garimpados, na cartografia dramatúrgica apresentada pelo corpus dançante.

Dos gestos da lição de cor da nova dança, que deslizam pelas expressões sonoro melódicas, os intérpretes detêm força base de aprender a aprender a dança verbalizada e intuem técnica de ritmos, melodias, posturas, dinâmicas e gestos  à cata das espacializações, buscando quebrar a película que abra caminho à conquista do simples dançar, contido no complexo de melhor expressar, enquanto ainda repercutem amores de margem, no objeto ditado na marca de ordem.

Há nisso tudo que gira em torno de "Amores", alguma beleza dedicada, em mais licença e poesia, de quem dança porque ama dançar e por todo o empenho de enviar recados do corpo que fala de (in)visíveis sinais de partitura de cada bailarino (a) contido(a) na narrativa dramática.

As intérpretes deslizam suaves. Os meninos, impetuosos, entremeiam  quebra e emendas dos amores consentidos pelo desejo narrado, mas há em algum, ou outro, uma dispersão da própria (in)consciência do Narciso em não abandonar o lago cômodo.

E, sem o neutro,  a personagem vem carregada das idiossincrasias pessoais e brilho do reflexo contagiando uma possível e melhor pegada do macho alfa. O amante que prende, solta, beija, "subjuga" seu desejo e oferece rosa com tônus do partner/parceiro, de sangue e areia, da mulher amada.

Às vezes o bailarino, contraventor da tradição e vetor da nova dança, ainda assim precisa mergulhar na memória e história da dança tradicional, não para ser Nijisnki ou Barishinikov, ou mesmo que sempre os negue possa definir melhor a postura física, neutra e forte, de tônus preciso que abalize a contradançante, a que imprime delicadeza e suavidade ao diálogo da escrita dramatizada. Assim, não haveria uma quase metamorfose da escrita em cena, onde o casal perde o contraponto, a assimetria da coreografia.  A ideia perde os oxímoros da estética dos corpos.

Fora um certo ausente dos opostos do contraditório, das gentilezas cruéis, dos belos horrorosos, da música ruidosa da partitura do corpo, em contraponto à simetria melódica e musical das canções dramatizadas, "Amores" se instala para a atenção da recepção.

Os figurinos carmins e, em desenhos ao corpo semi exposto, como que a declarar nua a pele de amores revelados. A luz de Pablo Erickson cria nuances de apropriação dos sentimentos contidos na pauta musical de melodias do sentimento dos corpos expressos na cena.

"Amores" junta dança, canto, teatro, poesia e ousadia estabelecida na cena da nova dança. Assinala ao imaginário os encontros e desencontros à força do amor, em dores de paixões reverberadas, desejadas e perdidas à ressaca das dores de "Amores".

A montagem recebe a assinatura do Projeto 8. Um Coletivo de artistas, com nascedouro tatuado à roda do destino cênico, à cerca de um ano. Desde então vem investindo na própria história e em franca insistência para manter a dinâmica criativa de gerar nova dança.

"Amores" está lançado ao covil de lobos e leões, deve maturar a experiência de resultado dado ao público e azeitar os passos na arte, da repetição da repetição, ao exercício do execício que foque na metacena de reinvenção das possibilidades.

fotos/imagem: (acervo Beth Báttali in Dança/ Projeto 8)

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