sexta-feira, 3 de julho de 2015

O Circo do Harém

retorna ao picadeiro
por maneco nascimento

O Grupo Harém de Teatro, em estreia mundial comemorativa aos 30 anos de carreira, marcou calendário na noite do dia 02 de julho, a partir das 20 horas, no palco do Theatro 4 de Setembro. Uma plateia vigorosa atendeu aos proclamos da estreia e veio dividir com o Grupo a nova montagem e rir das tiradas harenianas.

"Um Bico Para Velhos Palhaços", dramaturgia construída a partir do obra original do romeno Matéi Visniec, com direção de Arimatan Martins, para tempo de riso e entretenimento na construção da personagem pelos atores Fernando Freitas (Lippo), Francisco de Castro (Nico) e Francisco Pellé (Pepe).

Três Velhos Palhaços atendem ao anúncio de emprego e encontram-se, na anti-sala do anunciante, para concorrer à vaga aberta a profissional do riso. Velhos camaradas de picadeiro e palcos da vida de palhaçadas, eles ao tempo em que rememoram a vida de artistas, disputam a possibilidade de serem, cada um, o escolhido ao emprego. 

Despem-se da solidariedade, por vezes, e da camaradagem da profissão, depreciando um ao outro, como estratégia de enfraquecer a expectativa do colega e deixar em aberto o posto ao número um, o primeiro ao cargo de trabalho.

A cenografia, Emanuel de Andrade, de visibilidade do ator e solo, está composta por as bicicletas dos condenados ao ocaso. Peças essas de grande praticidade útil à narrativa e desenrolar da história, desde a entrada de apresentação das personagens, até o desfecho de fugas da cena.

+ complementam a cenografia, a contrarregragem de um baú de magias (suporte de Pepe). Todo o enredo está centrado no ator e seu método de atuar e destrinchar a personagem construída, em que os elementos cênicos confluem a melhor abertura de alegria, surpresa e marca de circo.

Os figurinos, Bid Lima, de cores quentes suavizadas, à estética da composição do vestir, estão para deixar à vontade as personagens e emblematizam liberdades a caminhos volpianos, cubismo de dramaticidade, na cor do riso e geometrias de Palhaços cerimoniais de picadeiros, em elegância e representatividade do colorido do clown tropical, com passagem por aspectos bufões, complementarizadas por fraques personalizados aos pais do riso.

Acerta muito e gera delicadeza plástica, na segunda pele dos velhos artistas,  a proposta da figurinista. Salvo, o figurino que serve à personagem Lippo, vestida por Fernando Freitas, que está com os braços nus, quebrando a continuidade e uniformidade sinérgica da composição, todo o desenho de figurinos compõe bem e veste o discurso estético da dramaturgia de estética apresentada.

A luz, Assai Campelo, para desenho de ribalta, também contrai ao lúdico e concentra energia que foca na arte do ator, na performance de reter a atenção do público e manter, bem recortada a ação dramática por iluminação sensível, econômica e detalhista. Luz que apresenta a personagem, em que a terra iluminada é chão de estrelas. Cada um tem tempo de brilho, seja o ator, ou o iluminador que direciona clareza em palco e geografias do drama.

A música original de Daniel Hulk e André de Sousa assoma beleza ao corpo do ato dramático e está para o enredo como água para chocolate, media a dosagem de pesar efeito musical sonoro de aproximação de linguagens e estreitar compreensão e sentido do enredo.

A conjunção da música à narrativa parece, talvez, que esteja ainda presa a certos vácuos. Se proposta, então é sinal de oxímoros, caso contrário então a música mereça percorrer + o picadeiro e deixar entrar a alegria dos velhos circos, das memórias de Velhos Palhaços na cata do próprio tempo.

A encenação de Arimatan Martins carrega a marca de expressão e linguagem de devoção ao humor inteligente, aliada as marcas de atores que detêm uma afinidade e compromissos cênicos à química de dividir cenas e gerar riso, do histrionismo ao escatológico, e persuadir a plateia a integrar os caminhos harenianos do humor e do entretenimento, sob a égide da compreensão da matéria cênica.

(Pellé e seu Pepe/foto Margareth Leite)

Encenador de mancheia, Arimatan arma o circo, sua alegria e desprendimento de marcar palcos e motes do riso ao fecho de liberdades de fazer rir, sem perder o fio da meada critico de aplicar efeitos dramáticos.

Para texto de Matéi Visniec desloca o foco do humor ácido, detido na economia venal e, de perspectivas que beirassem ao existencial e introspecto risível, na frieza da ironia pragmática, para lançar a narrativa às contextualizões da aldeia local e da picardia hareniana, sem perder o âmago do discurso político autoral e de fuga da servidão humana expiada.

As homenagens a personagens e celebridades locais, marca registrada de espetáculos, do Grupo, que ganham interatividade com a recepção, acentuam a memória da arte e do artista do riso dramático, em memória (Palhaço Beleza) e do circo Harém que também conta histórias do fazer rir.

(Nico, de Francisco de Castro/foto M. Leite)

Consegue, em aliança cúmplice com os atores da montagem, impor naturalidade de conjunção da cena e intérpretes e deixá-los muito à vontade, não só para as liberdades individuais, como a fundir ator e método ao mapa da construção dramática, das personagens dos artistas, em confronto com a construção das personagens mateivisniequianas. Tem características a riso e reflexão e mantém a insustentável proeza do ser teatro e técnica, em expressão compensada na cena.

(Nico e Lippo - Castro e Fernando/foto M. Leite)

Os Velhos Palhaços, Nico, Lippo e Pepe, de entrada a início do espetáculo, atendem, respectivamente, para o ato de Francisco de Castro, Fernando Freitas e Francisco Pellé. Há, já, na estreia da peça, para a composição das personagens, uma qualidade (in)falível nas fileiras do Harém ao domínio da piada e a fazedores de riso.

(o Velho Palhaço, de Castro/foto Margareth Leite)

Francisco de Castro e seu Nico, em embate de primeiras entradas com o Lippo, de Fernando Freitas, vai ao tempo de aquecimento da cena ganhando tranquilidade à suavização da tragicomédia, até ganhar total gentileza de apresentar gagues discretas, dramas metarisíveis e corpo humorado, em reprodução de ações de exercícios de convencimento e ilustração de narrativas. 

Castro rouba risos da plateia em pequenas delícias de humor até atingir o ápice da demonstração do roubo da melancia da feira, entre outros doces deleites de rir do próprio riso, na economia da demonstração. É Castro + digno e sempre concentrado em seu melhor.

(Palhaço Lippo e sua bicicletinha selvagem/foto M. Leite)

Fernando Freitas traz um Lippo de tiradas diretas e inflexões de intenções na ponta da agulha. Não fosse o Fernando, seria inventado, já que consegue manter postura corporal em atenção à personagem, marcar relevos de psicologia de falas e oralidades dos solilóquios que ganham visibilidade nos pequenos detalhes de movimentos, olhos que dizem + e entonações que atomizam matéria invisível e a liberam no ponto de causar impacto e riso, no drama, tragicômico ou na velha fórmula de tradição do Harém ao bom riso. Seu Velho Palhaço também é de deixar a plateia "velha".


(Fernando e seu Palhaço ácido/foto M. Leite)

O Velho Palhaço, Pepe, da veia de humor e histrionia naturalista de Francisco Pellé, vem somar-se ao triângulo do riso e elementar o terceiro vértice de picardias, ranzinzices, espertezas e, no pulo do Velho Palhaço, ser domador da plateia, em belos momentos de dramaticidade e cômico.

(a alegria do Velho Pepe/foto M. Leite)

Na licença poética de fingir e persuadir o público, o Pepe, de Francisco Pellé, atrai atenção a estratégias requintadas de enganar e passar a perna na comoção da plateia e ingenuidade dos colegas Palhaços, que pleiteiam o mesmo emprego. Máscaras trágicas e cômicas e desenhos de anatomias pantomímicas, corpo que diz da personagem risível, como geração da afiada língua e linguagem de gerar bom riso.

(Pellé em corpo de Velho Palhaço/foto M. Leite)

"Um Bico Para Velhos Palhaços" abre o ano de comemorações de 30 anos de serviços prestados ao teatro piauiense e lança à cidade sua nova aquisição de dramaticidade conspirada. A peça ainda merece ganhar dinamicidade e tempo pontual para não perder-se no cansaço das horas.


Mas é teatro Harém a toda prova. E, para a sorte lançada, lembrando Shakespeare, vejo que já venceu.

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