segunda-feira, 1 de junho de 2015

Da canção brasileira

porque Núbia Lafayette
por maneco nascimento

[Núbia Lafayette é o que se podia chamar de uma cantora que não negava as suas origens, sempre
cantando um repertório romântico, tornando-se um dos maiores nomes da Música Popular Brasileira (...) Uma cantora rotulada, com um jeito sofrido no seu cantar. Núbia Lafayette por ter sido autêntica na sua interpretação, transmitira um sentimento de paixão, sofrimento e dor (...) garantia que, apesar de cantar a amargura, ela era feliz, muito feliz (...) a saudosa cantora confessava que sua vida não tinha nada a ver com as letras das música que interpretava: "Minha voz sai assim mesmo. Até samba na minha voz sai uma coisa muito triste. É o timbre." Dizia.] (Santos, Hamilton. Nubia Lafayette: A voz sentimental. Salvador: EGB, 2014. 256 p.[Sou romântica, não sofrida, pag. 137])

(o biógrafo Hamilton Santos e a Obra em mãos/acervo H. Santos)

Livro organizado pelo fã incondicional e amigo pessoal, Hamilton Santos, a biografia da cantora popular brasileira traz, entre outras contas preservadas, histórias de vida e de shows na vida; cartas ao amigo Hamilton; discografia e registro iconográficos que revelam a bela das estações de música de fossa, por que não?; dor; paixão; sentimento e com uma qualidade vocal a lembrar sua rota de espelho, Dalva de Oliveira.

[Quando declarada a Rainha da Voz, no antigo programa de José Duba, Núbia Lafayette chegou a dizer que o título coube, na verdade, à falecida Dalva de Oliveira. "Esse negócio, hoje, já era. A gente tem que acompanhar a evolução. Sou rainha da minha casa, do meu marido e dos meus cachorros" (...) - Eu, cafona?
"Não sei se é cafona ou não. Eu canto o que sinto e o que sente o povo. É pecado a gente cantar para os outros? Na verdade o que se canta hoje é a mesma coisa. Eles complicam e eu simplifico."] (Idem.[Minhas mágoas, pags. 134, 135])

Assim era a autêntica e simples Núbia Lafayette. sincera, sem desmerecer ninguém, mas também sem querer diminuir-se. Cantava o que o povo queria ouvir e interpretou grande compositores e foi dona de grandes sucessos. Cresci ouvindo "Devolvi", em sua voz inconfundível, "Casa e Comida", a voz dramática sobrevalorizava o poeta compositor e aproximava a identidade de recepção.

[Quando perguntavam se Núbia Lafayette gostava que a chamasse de "Nelson Gonçalves de Saias", ela tinha a mesma resposta: - "De há muito, amigos me chamam assim por brincadeira. Afinal de contas é agradável ser comparada a um artista tão elogiado como o Nelson Gonçalves. Dizem, que como ele, procuro viver as músicas que interpreto e que tenho um estilo seresteiro. O fato só pode mesmo causar-me alegria."] (Idem.[Uma cantora de fado, pag. 127])

A intérprete que começou imitando Dalva de Oliveira, como muitas outras Divas da canção brasileira, tem o reconhecimento da própria Estrela Dalva, como consta no assento de passagens biografadas de Lafayette.

[ (...) no programa do saudoso Abelardo Barbosa, o Chacrinha. Objetivando homenagear a estrela Dalva de Oliveira no auge de sua doença, já internada, o Chacrinha levou a seu famoso programa de TV, as cantoras Dorinha Freitas, Edith Veiga e Núbia Lafayette, que cantaram grandes sucessos do repertório da eterna Dalva de Oliveira (...) E Dalva de Oliveira, no seu leito, no hospital, em seus últimos momentos, chorava de emoção ouvindo, atentamente, as cantoras. Quando Núbia Lafayette interpretava "Tudo Acabado", a Estrela Dalva afirmou: Núbia é a única cantora para ser a minha sucessora....] (Idem. [O velho guerreiro, pag. 129])

E, a exemplo de Dalva, Lafayette bem que sabia  soltar a voz. E ao interpretar sucessos de sua Diva, então.

(eternamente voz e paixão de Diva/reprodução)

[Demétrio Ferreira, produtor e pesquisador musical, grande amigo de Núbia, recordava que em 1958, no programa "A Voz de Ouro ABC", que J. Silvestre apresentava da TV Tupi, quando Núbia defendeu a composição "Brasil Saudoso", de Tito Clemente, cuja "cópia" foi tão descarada que lhe tirou o primeiro lugar.
- "Núbia Lafayette chegou a fazer o mesmo "oba" que Dalva fazia no final da música", recordava Demétrio.(Idem. [O velho guerreiro, pag. 129])

É dessa Núbia que o livro reúne frases de efeito (Minhas Confissões); fortuna crítica e curiosidades que a fizeram quem foi, na sua discrição e forma particular de ver as coisas. Ou pouco se sabia sobre o que praticava, ou por não alcançar a alta mídia, também não gerava interesse de paparazzis e revistas de fofocas e celebridades, mas era solidária sem querer promoção.

Núbia cantava em hospitais, clínicas e sanatórios e não cobrava nada e a cantora não admitia qualquer divulgação em torno do assunto. Embora tentasse manter em segredo, nalgum momento alguém descobriu e, em 1977, Sérgio Bittencourt abordou-a sobre esse seu segredo.

[Diante da "descoberta" do repórter, encabulada, justificava:
- "Não, é coisa minha, mesmo. Eu acho que a gente precisa dar um pouco de si a quem não tem nada ou quase nada, muito pouco. Eu gosto, de fato, de cantar em orfanatos, sanatórios. É uma gente que eu sei que precisa de calor humano. De gente que lhe dê alguma coisa. Eu dou o que tenho: a música. A felicidade estampada no rosto, por exemplo, de um velhinho abandonado, no rostinho de um menino órfão, já me paga. É o meu cachê, entende?" (...)
- Como é que você sobrevive?
- "Apresento-me em serestas. Posso inclusive, garantir que fui a primeira mulher seresteira que surgiu. E conforme as palavras de Sérgio Bittencourt, na época... 'Núbia, uma pessoa de coração aberto, tranquila...'"] (Idem. [Cantava para quem precisava, pag. 128])

É dessa mulher de coração aberto, tranquila que rompeu muitos anos de sucessos e um infindável repertório em discos gravados, que Núbia se fez o nome que representa e está contida em memórias registradas pelo amigo Hamilton dos Santos, no livro "Núbia Lafayette - A voz sentimento". Dessa personalidade com seu tempo de felicidade e sucessos inestimáveis que quebraram as fronteiras do preconceitos e marcaram época e hits no dial do rádio nacional.

E, como todo(a) artista, que humano(a) como qualquer um(a), também teve tragédias pessoais e outras ainda imbricadas no coletivo que a aplaudia e seguia-a onde fosse.

[Num período curto, ela perdeu sua avó, o tio e um cunhado. Todos atropelados (...) numa certa ocasião, quando se apresentava em João Pessoa, na Paraíba, assistiu ao desabamento do estádio, local do show, em vista da falta de segurança e do elevado número de pessoas. No final, muita gente ferida. Um grande admirador que foi ali ver e ouvir sua cantora, não resistindo aos ferimentos, veio a falecer. 
Outra tragédia aconteceu em Lajedo, rio Grande do Sul (...)
- "Um fã foi me ver e quando dançava ao som da minha música, ele foi atingido por uma bala, falecendo no local. Depois ficou esclarecido que a pessoa responsável pelo disparo, sabia que o encontraria no show, pela sua preferência pela minha voz" (...) o show se transformou em verdadeira tragédia. As pessoas deixando o local em disparada. A própria cantora permaneceu quieta por longo tempo, por trás da caixa de som morrendo de medo.(Idem. [Acontecimentos tristes que marcaram a vida da cantora, pag. 141, 142])

"Núbia Lafayette - A voz sentimento", de Hamilton dos Santos, é leitura necessária sobre essa voz, essa Diva, uma das + mais tradicionais cantoras do amor e paixões transformados em canção e revelados no timbre singular e devotado de quem soube defender, apaixonadamente, a profissão escolhida e a música que a fez tão feliz e agradou ao seu público fervoroso e fiel.

O livro ainda consta de rica hemeroteca que arquiva seu sucesso e vida popular de estrela da canção nacional e a galeria de fotos com amigos, colegas de profissão, estrelas da grandeza com quem dividiu profissão e talento, bailes populares e salões que reunia seu público embalado por sua voz da paixão.

A obra biográfica finaliza-se com O adeus de Núbia Lafayette e a repercussão da passagem da cantora ao tempo das estelares.

(A Diva Lafayette registrada em biografia/reprodução)

Vale a pena ler o livro, especialmente para quem foi, é seu fã e ou desempenha alguma curiosidade acerca dessa "que pertenceu, assim, a uma categoria de cantoras que tinham o dom de interpretar, hoje em via de extinção: as cantoras de belíssima voz (...) colocar o vinil na antiga vitrola, para deliciar-me ao som da sua voz cristalina e ouvir seu vasto repertório, que traduz a dor, a paixão e o desejo". (Idem. [ Voz cristalina, pag. 251])

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