quinta-feira, 24 de julho de 2014

Teatro em metalinguagem

 Ironias, humor ácido e talento para Azuis e Resplendores

Azul Resplendor é um dos exemplos de espetáculos em que o universo conspirou a favor. Renato Borghi e Elcio Nogueira Seixas, diretores brasileiros, cruzaram com o texto Azul Resplendor, de Eduardo Adrianzén, em 2008, durante um intercâmbio entre países íbero-americanos. 

Adrianzén está entre um dos melhores expoentes da dramaturgia peruana. Paixão, à primeira vista, pela comédia de humor de ironia ácida e evasão da privacidade dos bastidores do teatro, de qualquer teatro do mundo, é o que levou Borghi, Elcio e Eva a empreitarem essa montagem.
(o ator, autor e diretor de teatro, Renato Borghi/reprodução)

O texto que homenageia o mundo do teatro, exibe relações complexas estabelecidas entre os artistas durante a construção de um espetáculo, em que os jogos de poder, os afetos, as ambições, frustrações, entre outras variações do grande teatro humano, polarizam o mundo fora da cena(dentro da cena). 

(o ator/autor[Borghi], o diretor pavão [Werber] e a diva [Vivinha]/fts. J. Caldas)

Azul Resplendor realiza a expiação das entranhas do teatro, a vida comezinha no mundo dos bastidores. Os assuntos fora dos holofotes, mote de curiosidade das pessoas sobre o mundo dos artistas e celebridades, se espalham no texto de Adrianzén, revelam essa intimidade do camarim. Em tempos de culto às celebridades, a peça revela,  crítica e bem humoradamente, o ávido interesse que o público tem dedicado à vida privada dos artistas.
Metalinguagem inteligente e criativa reúne, na montagem do Teatro Promíscuo, realizada pela Renato Borghi Produções Artísticas, a paixão de primeiro encontro da atriz Eva Wilma e dos colegas diretores com o texto escolhido. 

Vivinha comemora 60 anos de carreira e 80 anos de idade e, em Azul Resplendor, realiza quase um revive da profissão, em que a personagem interpretada tem vivências que correm na mesma correnteza das memórias e experiências do teatro.
(Vivinha e Borghi, amigos da cena nacional/fotos João Caldas)

Com traquejo no teatro brasileiro, de imersão pela rádio novela, cinema e mais de oitenta trabalhos computados na teledramaturgia nacional, Vivinha está + que preparada para viver, com muito humor e talento, a personagem da grande diva, de Adrianzén.


(elenco de Azul Resplendor/fotos João Caldas)

Metateatro inspirador, de Azul Respledor, em que Eva Wilma é Blanca Estela, a atriz persuadida a voltar aos palcos, depois de um afastamento de 30 anos. Tito Tápia, vivido por Renato Borghi, é um ator de pequenos papéis, que cuida da mãe enferma. Com a morte da mãe, ele resolve homenageá-la e cria um texto para ser representado por Blanca. Tito, ao  tempo em que convence-a a voltar, também confessa o amor dedicado a ela e mantido em segredo durante anos. 

Alçada do "Crepúsculo dos Deuses", para nova expectativa de grandes personagens, a grande dama do enredo de Azul Resplendor, não se omite da oportunidade de apontar as próprias lições de vida em bastidores e desdobramentos da cena e abre reflexões sobre as experiências observadas  das  novas gerações do teatro.
”Então, os meninos aí - os atores jovens - fazem umas acrobacias bizarras que simbolizam não sei quê do desdobramento do eu... e dizem um monte de absurdos, frases ocas, sem sentido, que ninguém entende. Mas claro, se uma peça é entendida, é muito vulgar, muito careta... Eles justificam qualquer bobagem que sai da cabeça do Sr. Diretor dizendo que o Teatro também pode ser sugestivo, poético... Eles chamam isso de linguagem poética e serve para os pedantes fingirem que gostam. Aí, os artistas, os jornalistas, os críticos, os pseudo-intelectuais, todos podem se passar por pessoas de vanguarda, profundas. Como vão tirar o prazer dessa gente?!” (Blanca Estela, personagem de Eva Wilma, em Azul Resplendor, de Eduardo Adrianzén)

Blanca Estela  aceita o convite do autor, Tito Tápia, de voltar à cena, mas condiciona que um encenador de renome assine sua volta aos palcos. Blanca terá que conviver com os paparicados deuses da nova dramaturgia de espetáculos conceitual, arvorados nas fogueiras das vaidades. 
"...Um crítico do New York Times disse que 'eu devolvi ao teatro os rituais primitivos'. Eu sou primitivo. Não dou às pessoas o que elas querem ver, mas o que elas nunca imaginaram que poderiam ver. Eu sou Antônio Balaguer. O maior diretor deste país. O que marca a pauta. O que sabe. O que pode. O que surpreende. O que assusta. O que faz os demais olharem com inveja para os seus espetáculos e para as filas de seus espetáculos, sempre lotados. O diretor das polêmicas, dos ingressos esgotados. O que ocupa as primeiras páginas e ainda consegue dizer alguma coisa capaz de provocar. O que sempre arruma briga com os anões da arte. E quanto mais eu maltrato os Q.Is atrofiados, mais eles correm atrás de mim. Eu mostro a bunda pra plateia e eles me aplaudem. Sinto vontade de cuspir na cara imbecil de quem diz que me adora..." (Antônio Balanguer, personagem de Guilherme Weber, em Azul Resplendor de Eduardo Adrianzén).

Choques de vaidades e disputado espaço ao clube dos divinizados da espetacularização, os egos estão concentrados no esforço para alimentar a própria carreira, forjada na realeza do sucesso e paparicações.
"...Se você emplaca três sucessos, um atrás do outro, pronto, você está dentro. Já faz parte da realeza. Da casta dos privilegiados. E todos começam a repetir como papagaios que você é a melhor. Mas - sem falsa modéstia – a verdade é que eu sou mesmo..." (Luciana Castro, personagem de Luciana Borghi, em Azul Resplendor, de Eduardo Adrianzén).

Azul Respledor é um bom convite à espiação da intimidade de artistas, enquanto são estes bodes expiatórios da própria condução de vivências e relações intrigantes e defeituosas no grande teatro da vida de natureza escorpiã.

O metateatro, tramado na dramaturgia de Eduardo Adrianzén, conta com Eva Wilma, Renato Borghi, Guilherme Weber, Luciana Borghi, Débora Veneziani e Felipe Guerra, cada um com suas experiências e vida de teatro, na cena nacional. As personagens conflituosas se enfrentam nas peles de artistas brasileiros à dramaturgia peruana.
(arte divulgação Azul Resplendor)

Com Direção e Dramaturgia de cena assinadas por Renato Borghi e Elcio Nogueira Seixas, Azul Resplendor é sucesso de crítica e público e territorializa o conquistado. O jornalista Mauro Ferreira, colunista e crítico musical do jornal carioca O Dia, assim se manifestou sobre o espetáculo:

"O humor ácido do texto corrói os egos de todos os envolvidos com a ação teatral. O texto descortina bastidores nos quais são reconhecíveis diretores egoicos dispostos a demolir tudo e todos em nome de sua 'genialidade', jornalistas/críticos que fingem gostar de montagens herméticas para aparentar intelectualidade, galãs sarados de novelas que fazem teatro somente para conquistar o prestígio até então lhe negado, jovens atrizes tão talentosas quanto calculistas na condução de suas carreiras, enfim, tipos que quem milita no teatro vai saber bem identificar. Além do humor, o texto é costurado pelo afeto dirigido por um ator medíocre (Renato Borghi, diretor da peça que substitui Pedro Paulo Rangel na temporada carioca) a uma grande atriz veterana que já se retirara de cena, Blanca Estela Remíres, papel perfeito para Eva Wilma, precisa em cada fala e gesto. Enfim, "Azul resplendor" brilha. (...) Nem o dispensável colorido melodramático do fim do texto atenua o brilho de "Azul resplendor", peça que já merece uma ida ao teatro somente pelo fato de pôr Eva Wilma em cena, aos 80 anos de vida e 61 de luminosa carreira. Bravo!!!" (Mauro Ferreira, jornal O Dia(Mauro Ferreira, jornal O Dia/Da série "Boca de cena" - Azul Resplendor 16 de janeiro)

 Serviço:
"Azul Resplendor - A Comédia do Teatro" 
Dias 25, 26 e 27 de Julho, às 20h
No  Teatro 4 de Setembro
Informações: 86 3222 7100/9413 8444

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