sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Sociologia teatral


 Sociologia teatral
por maneco nascimento

A noite do último dia de concorrência do XIX Festival Nacional de Monólogos “Ana Maria Rêgo” – Ano Adalmir Miranda, que teve como sede de apresentações o palco do Theatro 4 de Setembro, foi das mulheres. Dia 08 de novembro de 2012, a partir das 19 horas, se conferiu os concorrentes, vindos do Rio de Janeiro e Minas Gerais. 

O primeiro espetáculo da noite, “Sala, Quarto, Cozinha, Banheiro e Outros Lugares Menos Cômodos” (RJ) pontuou, em 60 minutos, um exercício de franco atirador, definindo exatamente onde deveria acertar o alvo. Andréa Cevidanes, com direção dela, compartilhada com Gilvan Balbino, um furacão na cena em definição do (a) intérprete e sua escolha de exercer um bom fingimento.

Teatro que, a princípio, faz aparentar linguagem ligeira, por aproximar-se de dramaturgia com efeito de sucesso, a método muito praticado no eixo Rio/São Paulo e outras províncias reprodutoras do riso e do entretenimento fugazes. Algum sinal de maneirismos de “stand up”, ou exercício da improvisação e interativo de impacto da cena ativada pelo termômetro do público, logo se desfaz. É debelada qualquer aproximação de teatro “fácil” por si mesmo.

Há um tratamento de radiografias sociais sob a égide de discutir e refletir mulheres e suas histórias comezinhas, de profunda prospecção da alma humana e suas singulares experiências de vida, num contorcionismo de perfis das personagens à atriz e da atriz ao objeto pesquisado. Feito de forma livre e risível, nada condenável, pois numa das interfaces do teatro. E rir de si mesmo, como diria Aristóteles, é, nessa montagem, mote agradável do animal racional em praticado ato de convencer.

"O monólogo-documentário “Sala, Quarto, Cozinha, Banheiro e Outros Lugares Menos Cômodos” nasceu de entrevistas com seis mulheres aposentadas que se dedicam ao lar. A pesquisa durou seis meses e sua concepção partiu de uma reunião de almas femininas. No palco, a atriz Andréa Cevidanes apresenta as histórias dessas mulheres em cenas que misturam drama, comédia, tragédia e absurdos da vida cotidiana.” (assunto de release)

Na transversalização de linguagem, tendo também com suporte as novas tecnologias, a atriz Andrea recebe o público enquanto o filma e, simultaneamente, exibe o material colhido em telão ao fundo da cena. Dialoga com o espectador, através do câmera/telão e abre, nesse prólogo, um modelo de interação cênica e comunicação por novas mídias em quebra do paradigma de tradição, contornando as barreiras e paredes do quarto elemento teatral.

Dramaturgia de apresentação das personagens, em narrativas “neutras” da atriz que antecedem os “sketchs”, quadros que se vão alinhavando ao conjunto da obra. A montagem elastece um cordão de Ariadne e, aos poucos, se vai sendo envolvido no universo do drama e cômico das mulheres abordadas com acertada qualidade, azeitada, da atriz/jornalista/cronista de costumes das vidas expiadas.

Da Cenografia, muletas e caixas de guardados de onde vão sendo retiradas as personagens, a seu tempo e contexto na costura da narrativa. A adolescente funkeira virgem; a jovem dependente química e mãe de filhos protegidos pela maternidade imposta aos avós das crianças; o transsexual com sonhos de maternidade e a dona de casa que prepara um churrasco, enquanto avisa aos convidados que precisará comparecer a uma audiência, em juízo, movida pelo genro chifrado.

Teatro de quadros, atriz de tranqüila e certeira teoria e tese de objeto esmiuçado, dramaturgia convincente e de proposição de prever felicidade na recepção, em interativo articulado com o prazer do artista criador e ação vívida de arte de fingir e fingir bem. Cena doada nas medidas da arte e olhar às sociologias culturais de teatro, fora dos padrões das velhas chaves de Rebeca. 

Há corpo quente, alma sólida, espírito criativo, discurso social, politicamente correto, inquietações e conflitos inerentes a qualquer arte, mas há, sobretudo, operário (a) da cena em confecção de novas perspectivas, “curiando” a vida alheia em reflexão da vida da gente. A cena do espelho da madrasta que não reflete a transsexual, ou melhor a da imagem virtual(ideal) que está do lado de cá do espelho e depõe de costas para o público, um emblema significante a significados abertos.

A Iluminação de preparação, ou apresentação de cenas, cumpre o papel. A que recorta os rostos das personagens, no detalhe, sutiliza sensibilidade e ciência da cena.

Andrea Cevidanes vence a própria coragem e ousadia de apresentar monólogos recortados por personagem narradora “distanciada” e torna-se candidata à coroa de louros consignada da parreira do próprio sacrifício de concorrer aos riscos.

E, pela máxima júliocesariana, vim, vi e venci, + uma guerra de permanência teatral foi conquistada. É orgulho nacional, também fora do discurso de gênero. Nesse momento de FestMonólogos, se detém olhar + direcionado ao da dramaturgia laborada. Andréa serve ao propósito insistido, e “dane-se o que quiser”, é imperativo encenar.

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