sábado, 26 de maio de 2012

Ser artista


Ser artista
por maneco nascimento

O Brasil sempre foi, desde a chegada dos primeiros povoadores, um país do diverso. E com essa diversidade de gentes, raças, matizes e tecido social sendo construído à força do ganhar o próprio espaço, a arte vai ao seu tempo abrindo veredas da salvação e estabelecendo continuidade de culturas.

Em entrevista à Revista Afro B No. 4, de junho de 2011, uma das personalidades expressivas do teatro negro nacional, Ruth de Souza, fala de sua experiência, posição política e olhar crítico à realidade do Brasil brasileiro de negros, pardos, mestiçados e também desse grosso “de brancos” que se sente diferente, mas contém uma pequena parcela com algum livre arbítrio a sincretismo étnico.

Ruth, que completou 66 anos de carreira artística, dia 08 de maio de 2011, com passagem incontinenti pela arte do teatro, cinema e da teledramaturgia nacionais, aponta na entrevista que hoje há bem + atrizes negras lutando, embora para uma profissão de altos e baixos.

Uma corrida constante por um bom trabalho ao sucesso ou fracasso. “E para nós, atores negros, é muito mais difícil. A gente tem que lutar duas vezes para conseguir um lugar ao sol, como minha mãe costumava dizer (...) O negro começou a poder aparecer, por exemplo, no teatro, quando o Abdias Nascimento fundou o Teatro Experimental do Negro, o TEN. O meu sonho era ser atriz.” (Santos, Luis Carlos dos. Personalidade Negra – Ruth de Souza. São Paulo: IPSIS, 2011. Revista Afro B No. 4, 64p.)
  
Essa dama da cena brasileira foi a primeira atriz, prata da terra, indicada a prêmio internacional, no Festival Internacional de Veneza, em 1954, com o filmeSinhá Moça”, concorrendo com as três maiores estrelas da época, Katherine Hepburn, Michelle Morgan e Lili Palmer.(...) perdi por dois votos, mas fiquei muito feliz, como se tivesse ganho o prêmio (...)” (Idem)

Quem não teve a oportunidade de vê-la em atuações sublimes da telona, como emVereda da Salvação”, “Terra Violenta”, “Sinhá Moça”, “Filhas do Vento”, entre outros, provavelmente precisaria correr aos colecionadores, cinemateca memorial e tirar o atraso.

Na televisão, media de maior penetração entre um maior público, há registros de Ruth para novelas, minisséries, especiais, sempre com uma presença classuda e inflexões de interpretações tranqüilas e definitivas às personagens propostas.

O(a) profissional negro (a), na teledramaturgia brasileira, não pode ser dispensado(a) do regozijo da memória nacional. Ruth, Léa Garcia ( a Rosa da Escrava Izaura, Globo), Zeni Pereira, Cléa Simões (a saudosa Tia Anastácia, do Sítio do Picapau Amarelo, Globo), Chica Xavier, Solange Couto, entre outras da geração ouro.

(ondeanda.multiply.com/photos/album/Dramaturgia Brasileira - Ruth de Souza)


Da novidade que povoa os dias de hoje Maria Ceiça, Juliana Alves, Camila Pitanga, Taís Araújo, Dani Ornellas e uma fil(h)a em construção à nova geração de atrizes negras que tiveram as veredas abertas por Ruth de Souza e grandes companheiro(a)s de profissão.


O meu sonho era ser atriz. Encantada com os filmes de Hollywood. Eu queria ser uma estrela, igual as de Hollywood e, por acaso, isso me aconteceu ao pegar a Revista Rio (...) Ela publicou quatro páginas sobre um grupo de negros que estava fazendo teatro, ensaiando na UNE (...) Eu fiquei tão encantada e pensei então: ‘É ai que eu posso ser atriz’. Porque não havia atriz negra. O único ator negro que trabalhava, estava começando era o Grande Otelo, mas atriz não tinha.” (Idem)

Ser artista, no Brasil, não gera qualquer facilidade, especialmente porque cultura aqui é a parenta pobre da política nacional. E, em país de preconceito de cor metaforizado, a mulher de falas políticas, Ruth de Souza, mantém papel de defesa da dignidade e presença da pessoa negra:

É difícil você encontrar uma mulher negra como vendedora de uma loja, de uma butique, não tem uma bancária. Eu não estou falando de grandes especialidades e ai alguém fala ‘é, mas tem a Dra. Fulana!’ Tem, mas é uma só. Então sobre essa coisa de invisibilidade da mulher negra eu sempre reclamei, sempre procurei dar uma linha de comportamento, mostrando, por exemplo, quando eu ia representar uma escrava.” (Idem)

Essa é a Ruth de Souza que o Brasil respeita e se orgulha de ter no coletivo, não só do Teatro Experimental Negro, como na cultura política nacional de confirmação da raça, cor, cidadania e cena brasileiras.

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