sábado, 24 de março de 2012

A Deus, Chico.


A Deus, Chico.
por maneco nascimento

 (Chico Anysio/professor Raimundo na Escola do.../foto divulgação)

A ponte aérea para as estrelas despachou “chek in” ao grande e nosso maior humorista brasileiríssimo, o Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, no último dia 23 deste março corrido. Cearense porrenta, de Maranguape, atomizado para construir história, em solo mortal, na franca data de 12 de abril de 1931.

De alcunha artística e de poesia à comunicação social d’arte ampliada, tornou-se o inimitável Chico Anysio, em carreira iniciada como radioator e comentarista de futebol, quando ao lado da irmã Lupe Gigliotti concorreu a teste seletivo na Rádio Guanabara. Entrou para compor elenco de radionovela e saiu do teste radioator e locutor comentarista de futebol.

(...) Por acaso eu sou ator. Talvez eu não seja o ator que imagino (levando-se em conta o que todos imaginam ser um ator), mas ator, porque dois terços da minha vida eu dediquei a este trabalho onde um cara faz o papel de médico ou palhaço, de chofer ou milionário, de mendigo ou pastor de almas, seja lá que personagem for. E isso é o que faço.” (Anysio, Chico. Sou Francisco. Rio de Janeiro: Rocco,1992. pag. 9)
 (grande Chico Anysio/foto divulgação)
A minha geração jamais negaria que cresceu vendo televisão, veículo de diversão, entretenimento, informação e, para os mais céticos, alienador. Salvo as defesas político ideológicas, foi a televisão que chegou à Teresina, na década de 1970, que possibilitou a muita gente conviver com a “caixinha mágica” e dobrar o riso com o humor qualitativo e crítico diferenciado, produzido à telinha pelo mestre Chico Anysio.

A minha dúvida de ser ou não ser ator é produzida pelo descrédito dos críticos do meu país, que sempre preferiram me chamar de humorista ou de comediante, (...) Sou um ator, queiram eles ou não. Desde o rádio, época em que muitos ainda nem tinham nascido, até à televisão, veículo onde a crítica perde, inclusive, o sentido (...) deixe-me explicar que nunca me senti diminuído ao ser chamado de humorista ou comediante, porque isso eu também sou, orgulhosamente. Se me permitem: ‘modéstia-à-partemente`.” (Idem. pags. 9, 10)
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Foi na televisão que textos, “sketchs”, quadros e diálogos fabulosos ganharam vida rica de personagens inestimáveis como o seu Popó, o velhinho ranzinza; o pastor Tim Tones, de 1984, com o jargão “quem tem põe, quem não tem tira...”, uma paródia de sutilezas e ironias à cena local, usando como cavalo a imagem do pastor fundamentalista Jim Jones. O personagem do ator clássico Alberto Roberto, d’uma pavonice deliciosa.
  (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

E uma galeria de humor, inteligência, sarcasmo, crítica venal e política de fazer rir em abordagens de temáticas sérias, humanas e de identidade com tipos naturalmente identificáveis no país de Macunaíma. O personagem Silva, com óculos “fundo de garrafa”, chapéu de couro e peruca estirada; Gastão, o pão duro; Bozó; Bexiga; Tavares, o comandante de avião; Urbulino; Washington, o jovem; Nazareno: “Calada!”.
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Os tipos antológicos ganharam voz na boca popular, como Salomé de Passo Fundo; Justo Veríssimo, o político que odiava pobre; Painho, o pai de santo, baiano e dengoso; Bento Carneiro, o vampiro brasileiro; Pantaleão, o contador de “causos”: “É mentira, Terta?”.
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Ou ainda o Haroldo, o delicado; o maravilhoso Professor Raimundo Canavieira que se desdobrou à Escolinha do professor Raimundo: “E o salário, o´...” e o Profeta que sempre encerrava o programa semanal com uma mensagem de paz e reflexão ao telespectador brasileiro.

 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Chico Anysio, como todo jequitibá que enverga, mas não quebra, todavia precisaria cumprir ciclos de retorno ao jardim das essências, tomou forma de poeira de luz, nos primeiros vazios e preenchidos espaços da tarde de 23 de março de 2012.
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Havia três meses que sofria de complicações da idade e saúde, problemas respiratórios e processos de desligamento terrestre rumo ao transcendente.

Aos 65 anos de carreira, com mais de 200 tipos criados para o rádio e televisão, deixou a terra mortal com 81 anos de idade bem vividos, aproveitados até o último estimulo de rigor ao compromisso da profissão e prazer escolhidos. Voltando-se a sua memória e história conquistadas disse, ao falar da profissão:
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

(...) Isto talvez explique o fato de ter sido, a partir de 1948, locutor, narrador, galã de novelas de rádio, locutor ‘atrás do gol’, locutor de futebol no segundo jogo, comentarista de futebol, locutor de radiobaile, ator característico, novelista, redator de todos os tipos de programas do rádio, teleator, escritor, autor de letras de música, compositor, imitador, pintor e ainda ter tido tempo de namorar centenas de vezes, casar cinco e produzir cinco filhos, por enquanto.” (Idem. pags. 10, 11)
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

O Brasil dormiu sem Chico, ontem, e acordará a partir d’agora sem o Anysio que durante décadas contagiou o país com seu ótimo humor e demonstrou ao brasileiro que não é só de sofrimento e corrupção, é também do riso, da boa piada política, da pilhéria e do picaresco inteligentes que se constrói a cultura nacional.
 (fotografia.folha.uol.com.br/galerias/-personagens-de-chico-anysio)

Grande ator, comediante, humorista. Grande homem, grande artista que atestou: “Sempre detestei a piada-pela-piada, a graça ‘de graça’, porque na minha concepção, humor é algo que pode ser tudo, até mesmo engraçado. Charlie Chaplin prova isso.” (Idem. pag. 12)

A Deus, Chico. Porque a nós resta a doce lembrança dos dias em que melhor nos fez rir.








Um comentário:

  1. De um valor humorístico, cultural e pessoal inigualável, digo pessoal, pois assistia com meu saudoso pai o programa desse gênio do humor, que era o maior do Brasil, e olhe lá do mundo, e que tiradas sensacionais, que humor típico Tupiniquim, que inteligência impar. Muita saudade e gratidão por ter vivido aqueles tempos. Parabéns pela postagem, que mesmo sendo de 8 anos atrás, pra mim continua sendo super atual, pois o talento e a genialidade nunca morrem pra quem sabe dar a eles o valor merecido.

    ResponderExcluir